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terça-feira, 29 de abril de 2014

Poemanifesto denuncia impactos da mineração em Minas Gerais

Congonhas,
que já foi do campo,
que hoje são campos onde não nascem mais congonhas,
são campos de terras de gente sem chão,
de águas que correm por baixo das terras,
de águas que lavam o minério,
mas deixam a alma e a vida suja
do lixo que corre solto
por debaixo dos tapetes

As águas de Congonhas correm do fundo da terra
pra superfície do rejeito.
Rejeito de povo
Rejeito de gente
Rejeito de cultura
Rejeito de esperança

Congonhas do mundo
que consome minério
e junto com ele os mineiros,
e os não mineiros,
forasteiros,
vindos do Brasil profundo
e rejeitados na superfície das coisas vãs,
na superfície ordinária da razão econômica,
na superfície canalha da desrazão política,
na indignação mais profunda
do rejeito da dignidade humana

O mesmo minério,
que na alquimia da produção
vira dinheiro,
vira salário,
vira exploração
(do trabalho e dos recursos),
e vira lucro
e que nunca vira imposto –
se vira, some na nuvem de fumaça da política dos seus políticos –,
é usado todos os dias
pra cimentar a boca de quem tem voz
e não deixar sair o grito,
e sufocar a vergonha de cada dia
que fermenta o pão que o diabo amassou
e vende receita de bolo com cobertura doce
que esconde o amargo que pode azedar a saliva

É preciso falar
É preciso deixar às claras
É preciso não poupar ninguém

Porque não é assim que eu te sonho, Congonhas!
Porque eu não quero ficar aqui com as unhas sujas desse mesmo minério venenoso!
Mas também não quero sair daqui
Eu quero ficar aqui
e aqui te sonhar,
e aqui acariciar suas montanhas
com o meu olhar de poeta,
e abraçar os seus profetas
como se fossem meus amigos queridos,
e abraçá-los como se eu abraçasse a cada um que aqui deixou de sonhar
e ensinasse a eles duas ou três lições sobre como mudar o mundo

Eu quero ficar aqui
e aqui poder deitar nas suas águas
sem ter que remover a crosta marrom do seu minério sobre a minha pele

Eu quero ficar aqui
e aqui poder respirar fundo
sem ter que escarrar o pó do seu minério que entra no meu pulmão

Te quero linda, Congonhas!
Muito mais que mais bonita...
Te quero livre!
Te quero lírica!
Te quero voltando a sonhar
um sonho que se sonha junto

Dica:
Em 2013, a Mídia Ninja produziu o documentário "Enquanto o Trem não Passa", um debate sobre o setor da mineração no Brasil, atividade econômica que cresceu 550% nos últimos  10 anos. O documentário mostra a faceta daqueles que são diretamente atingidos e busca chamar a atenção da sociedade para sobre os impactos e atentar-se para o Novo Código da Mineração que poderá ser votado em breve no Congresso Nacional. Movimentos sociais e ambientalistas dizem que a proposta do Governo não traz salvaguardas sócio-ambientais, garantias ao meio ambiente e nem segurança aos quilombolas e povos indígenas.


por Julio Satyro

segunda-feira, 28 de abril de 2014

José Fanha: Eu sou português aqui


 
 
 
 
 
 
 
 
Eu sou português
aqui
em terra e fome talhado
feito de barro e carvão
rasgado pelo vento norte
amante certo da morte
no silêncio da agressão.

Eu sou português
aqui
mas nascido deste lado
do
lado de cá da vida
do lado do sofrimento
da miséria repetida
do pé descalço
do vento.

Nasci
deste lado da cidade
nesta margem
no meio da tempestade
durante o reino do medo.
Sempre a apostar na viagem
quando os frutos amargavam
e o luar sabia a azedo.

Eu sou português
aqui
no teatro mentiroso
mas afinal verdadeiro
na finta fácil
no gozo
no sorriso doloroso
no gingar dum marinheiro.

Nasci
deste lado da ternura
do coração esfarrapado
eu sou filho da aventura
da anedota
do acaso
campeão do improviso,
trago as mão sujas do sangue
que empapa a terra que piso.

Eu sou português
aqui
na brilhantina em que embrulho,
do alto da minha esquina
a conversa e a borrasca
eu sou filho do sarilho
do gesto desmesurado
nos cordéis do desenrasca.

Nasci
aqui
no mês de Abril
quando esqueci toda a saudade
e comecei a inventar
em cada gesto
a liberdade.

Nasci
aqui
ao pé do mar
duma garganta magoada no cantar.
Eu sou a festa
inacabada
quase ausente
eu sou a briga
a luta antiga
renovada
ainda urgente.

Eu sou português
aqui
o português sem mestre
mas com jeito.
Eu sou português
aqui
e trago o mês de Abril
a voar
dentro do peito.


In Obras de José Fanha

quinta-feira, 17 de abril de 2014

"Luíses - Solrealismo Maranhense" : filme denuncia Maranhão dos Sarneys



Filme coletivo feito sem recursos, sobre a situação política/anti-social da capital maranhense (e por extensão do Estado do Maranhão). Mesclando depoimentos sobre o caos da saúde e da situação agrária, um manifesto contra os podres poderes do clã dos Sarneys (que governam o estado há mais de 40 anos),o diretor coloca em xeque de forma inventiva o caos e a absurda situação histórica da região.

Filme: Luíses - Solrealismo Maranhense

Ano: 2013

Produção: Éguas Coletivo Audiovisual

Site oficial: Solrealismo.com

Leia mais sobre o filme em nosso site aqui.

quarta-feira, 16 de abril de 2014

A história de uma fábrica ocupada contra o capitalismo!

Da Revista Miséria 


Para ajudar os trabalhadores da Flaskô nessa luta clique aqui.

Conheça mais no vídeo abaixo:

sexta-feira, 11 de abril de 2014

Hemorragia

Enquanto as dores se espalham pelo corpo cansado
Olho minhas mãos e meus pés
Olho as mãos e os pés dos outros
E torno a olhar minhas mãos e meus pés
Mãos e pés surrados

A melhor conversa que vivi com um operário
Não continha uma palavra sequer
Ele entrou no trem e olhou meus pés descalços,
Sentou frente a mim, afrouxou a bota e se libertou
Ficamos então a olhar os nossos calos da vida

É sempre bem vinda a solidariedade dos que não têm calos.
Porém é inevitável não sangrar a cada vez que noto
mãos e pés delicados e bem tratados

Lopes Camarada